Fonte: globo.com por Carla Gomes
No filme de David O Russel indicado a oito Oscars, Bradley Cooper vive Pat Solatano, um professor com distúrbio bipolar que passa meses internado em um hospital psiquiátrico. Quando finalmente coloca os pés na rua, ele corre – para fugir dos próprios sentimentos, para rever a mulher amada, para se afastar das cobranças familiares – ele corre. Correndo faz uma amiga, igualmente desequilibrada. E correndo vai retomando o próprio equilíbrio.
- A corrida libera endorfina. Esporte vicia... graças a Deus - disse o psiquiatra Marcos Gebara, diretor regional da Associação Brasileira de Psiquiatria.
Segundo o treinador Manuel Lago, a atividade física ainda ajuda a relaxar.
- O exercício também libera a tensão muscular e aumenta a temperatura do corpo, provocando relaxamento.
O estudante João Victor Nascimento, de 23 anos, provou os resultados no próprio corpo (e mente).
Vítima de repetidos episódios de depressão, há oito meses descobriu a corrida.
- A corrida me ajudou bastante e continua ajudando a diminuir essa angústia. No final de um treino já me sinto melhor - disse.
Mas essa é só a pequena ponta do (bom) iceberg. Atualmente, muitos estudos provam que o esporte aumenta consideravelmente a produção de neurotrofinas, uma família de proteínas que protegem os neurônios.
Imagine que o neurônio é uma planta e nasce a partir de uma semente. Se você a coloca em um solo pobre e arenoso, certamente terá uma planta de baixa qualidade. Se a colocar em solo fértil, terá uma árvore grande, frondosa e resistente. A neurotrofina é o "jardineiro" do neurônio – comparou Marcos Gebara.
Corpo x mente
Todas as doenças da mente têm componentes genéticos e componentes ambientais, em maior ou menor proporção. Em algumas, como a esquizofrenia, o papel orgânico é mais preponderante, mas até o estresse causa perda de neurônios, sabia?
- O estresse crônico provoca atrofia e eliminação de neurônios. E a atrofia está diretamente relacionada à depressão, o mal do último século - disse Gebara, citando estudo recente da Organização Mundial de Saúde.
Segundo o texto, a depressão já é comum em todas as regiões do planeta e atingiu 5% da população mundial no último ano - nada menos do que 350 milhões de pessoas.
- E isso não é o mais grave: até 2030, a depressão vai ser a doença mais incapacitante de todas, ultrapassando os problemas cardíacos – alertou o médico.
O depressivo, em geral, apresenta menos força de vontade para ingressar em um programa de exercícios físicos, mas isso não é motivo para desistir dele.
Manuel Lago já desenvolveu algumas estratégias para fazer todo mundo se mexer.
- É sempre bom levar o aluno para ambientes externos, como praias, lagoas e parques, quanto menos gente olhando, melhor. E o exercício deve começar leve, com caminhadas curtas e pedaladas, sem preocupação com ritmo ou freqüência cardíaca - disse.
Também chamada de "depressão bipolar”, a doença do professor Pat do filme é a segunda mais comum no consultório do psiquiatra.
- Com a melhora do diagnóstico, muitos casos tratados com depressão hoje são identificados como bipolaridade, com picos de euforia e depressão.
E não adianta culpar apenas os fatores externos – o estresse, uma perda, uma traição, como no filme.
O gatilho só dá início à crise se a estrutura já estiver frágil, em mais uma metáfora do doutor Gebara.
- Pense em uma ponte estaiada, em que as conexões neurais são os cabos de sustentação. Se eles não forem de boa qualidade, até um caminhão pequeno pode colocar tudo abaixo.
Com tanta informação em mãos, o médico não dá chance para o azar e coloca em prática o que indica a seus pacientes.
Praticou todos os esportes de quadra na infância e segue correndo, pedalando e surfando aos 60 anos.
- Não adianta ser atleta de final de semana, o cérebro e o corpo precisam de estímulo diário - disse Marcos.
Para quem já está doente, o esporte ainda é uma boa fonte de objetivos - uma prova a concluir, um tempo para cumprir, um peso a perder - fatores importantes no controle da mente. Além disso, hoje a medicina sabe que os neurônios não nascem apenas na infância, mas seguem brotando durante toda a vida. Contanto que o solo seja fértil, nunca é tarde para gerar uma boa florada.
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